Microagressões: Como funciona a discriminação sutil?

Existem pessoas que sequer percebem que estão discriminando outras com base na cor de sua pele ou em seu gênero. Outras não compreendem que microagressões podem ser psicologicamente violentas. Há ainda aquelas que não acreditam que suas ações inconscientes têm consequências, até que vejam evidências científicas que comprovem isso. Pois bem, aqui estão.

Apesar de nosso país ter leis contra a discriminação por razões étnicas, religiosas, de gênero e sexualidade, isso não significa que o preconceito tenha acabado. Hoje, precisamos nos preocupar tanto com as raízes sutis do preconceito e das microagressões quanto com o racismo e o sexismo gritantes.

Encontramos o preconceito sutil no campo das “suposições injustificadas“, das “não intenções” e das “piadinhas“. Assim como, ele também se manifesta na falta de esforço para incluir e acolher pessoas que são diferentes de nós ou que não se encaixam em nossas expectativas.

Microagressões

Uma palavra usada para descrever as expressões do preconceito sutil é “Microagressão“. Refere-se à pequenas ações, como a repetição de estereótipos através de “piadinhas” ou o ato de ignorar repetidamente o ponto de vista de alguém. Essas atitudes podem parecer simplórias e indignas de comentários, mas podem marginalizar um indivíduo.

As pessoas que cometem essas microagressões podem fazê-lo de forma completamente inconsciente, sem perceber que possuem uma visão preconceituosa, ou até mesmo intencional. Podemos distinguir nossas atitudes entre explícitas (crenças e sentimentos que admitimos) e atitudes implícitas (crenças e sentimentos revelados por nossas ações). Por exemplo, você pode dizer que não é machista, pode até afirmar que é antissexista, mas, se interromper mais mulheres do que homens em reuniões, é uma atitude implícita sexista. O que é muito diferente da atitude explícita não sexista que você professa.

Preconceito sutil

O problema das microagressões  é que elas são, por definição, ações sutis. São pequenas diferenças na forma como as pessoas são tratadas, pequenas exclusões, piadinhas e diferenças ambíguas no tratamento dado a uma pessoa em relação a outra. Isso torna o preconceito sutil mais difícil de medir, tratar e, para algumas pessoas, de levar a sério.

Esse é o raciocínio dos “combatentes do mimimi“: As pessoas que reclamam de serem tratadas de maneira diferente em pequenas coisas, são acusadas de serem excessivamente sensíveis ou de tentar promover uma “vitimização”.  Afinal, pequenas diferenças são apenas isso — pequenas. Elas não deveriam ter grandes influências nos resultados da vida e não deveriam ser o foco da nossa atenção! Certo?

Pois é… ERRADO! Muito errado! Vejamos o estudo a seguir.

Vários pequenos cortes  em uma mesma grande ferida

No início dos anos 1970, o professor Carl Word liderou um estudo na Universidade de Princeton, na qual convidou recrutadores inexperientes de pele branca para participar de uma experiência de seleção de candidatos brancos e negros para emprego. A experiência avaliava se os recrutadores tratavam os candidatos de maneira diferente com base na cor de sua pele.

Apesar de acreditarem que sua tarefa era encontrar o melhor candidato, os recrutadores trataram de forma desigual os participantes. Eles se sentaram mais longe dos candidatos negros e exibiram menos sinais de engajamento, como contato visual ou inclinação durante a conversa. Uma atualização recente desse estudo mostrou que esses sinais não verbais de simpatia, que não estavam relacionados às atitudes explícitas dos recrutadores, funcionam de forma independente das crenças confessadas sobre raça e racismo.

A experiência de Princeton, contudo, não nos fala sobre a dor de ser tratado de forma diferente por causa da cor da pele. Os candidatos negros foram tratados de maneira significativamente inferior em comparação com os candidatos brancos. Além dos sinais não verbais, receberam, em média, 25% menos tempo nas entrevistas! Isso, por si só, já seria uma injustiça, mas quais são as consequências e desvantagens de ser tratado dessa maneira?

Quais as consequências e desvantagens para quem sofre microagressões?

No segundo experimento, após medir o comportamento não verbal, Word recrutou novos voluntários, treinando-os para reagir da mesma forma que os recrutadores originais. Foram treinados para tratar os candidatos brancos com contato visual, sorrisos, sentando-se mais perto e permitindo-lhes falar por mais tempo. Outro grupo foi treinado para tratar os candidatos como os entrevistadores haviam tratado os candidatos negros.

Em seguida, os pesquisadores recrutaram novos alunos da Universidade de Princeton para atuar como candidatos a emprego. Eles foram distribuídos aleatoriamente para serem tratados, de forma não verbal, como os candidatos brancos ou negros do primeiro experimento.

No segundo experimento, após medir o comportamento não verbal, Word recrutou novos voluntários, treinando-os para reagir da mesma forma que os recrutadores originais. Foram treinados para tratar os candidatos brancos com contato visual, sorrisos, sentando-se mais perto e permitindo-lhes falar por mais tempo. Outro grupo foi treinado para tratar os candidatos como os entrevistadores haviam tratado os candidatos negros.

Em seguida, os pesquisadores recrutaram novos alunos da Universidade de Princeton para atuar como candidatos a emprego. Eles foram distribuídos aleatoriamente para serem tratados, de forma não verbal, como os candidatos brancos ou negros do primeiro experimento.

Resultados

Os resultados nos permitem ver a profecia auto-realizável de discriminação. Candidatos que receberam os sinais não verbais mais agressivos tiveram um desempenho pior na entrevista. Eles tiveram muito mais erros de fala, na forma de hesitações, gagueja, enganos e frases incompletas. Também escolheram se sentar mais longe do entrevistador.

Não é difícil ver que, em uma situação como uma entrevista de emprego, tais divergências no tratamento podem ser o suficiente para que alguém perca uma oportunidade de trabalho. O que é notável, é que o desempenho dos participantes havia sido prejudicado por diferenças não verbais, do tipo que muitos de nós pode produzir sem querer ou perceber.

Além disso, o efeito foi observado em estudantes da Universidade de Princeton, uma das universidades de elite do mundo. Se até mesmo um sujeito pertencente a uma elite privilegiada, sofre sob este tipo de tratamento, poderíamos esperar efeitos ainda maiores para pessoas que não tem essas vantagens.

Conclusão

Experiências como estas não proporcionam toda a verdade sobre discriminação. Problemas como o racismo são modelados por muito mais do que atitudes individuais! E, muitas vezes, apoiados por preconceitos explícitos e não apenas sutis. O racismo afetará os candidatos antes, durante e após as entrevistas de emprego em muitas mais maneiras do que eu descrevi acima. Mesmo com boas intenções, as reações das pessoas diante de grupos minoritários podem ter efeitos poderosos.

Fontes:

Envie para alguém que gostaria de ler esse texto:
  1. Joana Silva Bsb 2 de julho de 2016 at 17:04 - Reply

    Legal !!!

    • Diálogo - Espaço de Psicologia 3 de julho de 2016 at 18:06

      Obrigada Joana! Fico feliz que tenha gostado! <3

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Autoria do texto
Tom Stafford

Texto original: https://www.bbc.com/future/article/20160608-the-true-impact-of-tiny-microaggressions

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