Relacionamentos | Violência contra a mulher

Gaslighting – Uma forma de violência sutil

De vez em quando eu penso em todas as vezes que você me ferrou, mas me fazia acreditar que era sempre algo que eu tinha feito.Somebody that I used to know - Gotye

Definição: O que é Gaslighting?

Gaslighting (derivado do termo inglês Gaslight, “a luz inconstante do candeeiro a gás”) refere-se a um tipo de abuso psicológico. Trata-se de um método de manipulação sutil, mas eficaz, no qual o agressor — seja ele parceiro, chefe ou até mesmo um dos pais — apresenta informações falsas ou omite a realidade. A intenção é fazer com que a vítima questione sua própria memória, conduta, percepção e sanidade, destruindo sua autoconfiança e, em casos extremos, sua saúde mental.

O termo surgiu do suspense norte-americano de 1944, Gaslight. O filme retrata o personagem principal, Gregory Anton, manipulando psicologicamente sua esposa, Paula, com a intenção de levá-la à loucura. Gregory faz com que Paula acredite ser mentalmente instável e cleptomaníaca, induzindo-a a duvidar de suas próprias memórias, comportamento e até de si mesma. Gregory é o pior tipo de vilão: um verdadeiro assassino da alma.

Ao final deste texto, assista ao filme!

Uma forma sutil de enlouquecer quem confia em você

“Você é louca! Nunca fiz isso!” “Isso é coisa da sua cabeça!” Ele nega suas atitudes e coloca a culpa em você. Te faz acreditar que você está sendo incoerente, vendo coisas onde não existem, que está ficando louca

Os níveis de abuso podem variar desde pequenas encenações até a manipulação de grandes eventos. O objetivo é desqualificar, diminuir ou colocar em dúvida a autenticidade de qualquer sentimento de frustração, raiva, angústia ou medo da vítima. Dessa forma, o agressor leva a vítima a questionar a própria percepção, sentimentos e, em última análise, destrói sua identidade e autoestima em um jogo de manipulação, poder e controle.

O abuso constante deixa marcas profundas na personalidade da vítima e é mais comum do que imaginamos. Quando a vítima é uma criança, a situação é ainda mais grave, pois ela está em uma posição de maior vulnerabilidade.

Você só pode estar de TPM pra ficar paranóica e chorona desse jeito!Desqualifica suas percepções e emoções

O perpetrador do gaslighting distorce o que lhe é dito, levando a vítima a contradições ou convencendo-a, com “argumentos lógicos”, de que ela não está dizendo a verdade, sendo injusta ou confundindo suas próprias memórias. Mesmo quando a vítima reúne forças para confrontar seu agressor, não há qualquer admissão ou arrependimento pela manipulação e abuso. A parte mais cruel do gaslighting é que ele corrói, aos poucos, a mente da pessoa abusada, que acaba questionando a própria percepção e sanidade.

Porque eu faço tudo errado?A vítima começa a duvidar de si, porque o abusador diz frequentemente como ela está sempre errada

Quem é o agressor?

Embora tenhamos usado o exemplo do filme para ilustrar as manipulações psicológicas silenciosas de um marido em relação à esposa, o gaslighting nem sempre exige uma elaboração premeditada. A prática pode acontecer sem planejamento e se baseia na crença de que é aceitável tentar alterar a percepção da realidade da outra pessoa para obter alguma vantagem, como escapar de um problema.

O agressor é, geralmente, alguém que evita confrontos diretos em várias áreas da vida. Dificilmente admite falhas, defeitos e fragilidades, nem mesmo na intimidade. Muitas vezes, trata-se de alguém disposto a proteger sua imagem social a qualquer custo e que manifesta consternação ao ser confrontado ou questionado sobre sua integridade.

Será que isso realmente aconteceu ou estou exagerando? Será que entendi mal alguma coisa?Mesmo tendo certeza, sente culpa por estar confrontando, acredita que talvez você possa estar errada

O manipulador geralmente nega sempre que é confrontado. Se você observar o histórico, talvez perceba que ele nunca admite um erro. Dificilmente há um pedido claro de desculpas. E, quando não nega completamente o ocorrido, ele tende a relativizar, reconhecendo que certos eventos podem ter acontecido, mas sugerindo que a vítima não se lembra bem ou está interpretando mal suas palavras e ações. Contraditoriamente, perante terceiros, o abusador se mostra preocupado e cuidadoso, insinuando que o outro, “o louco”, tende a mentir ou é “problemático” e “quer atenção”.

Por todas essas razões, o gaslighting é extremamente difícil de reconhecer e enfrentar. A vítima tende a ficar confusa, incapaz de perceber a manipulação, o que pode levá-la a questionar suas próprias memórias e até seu juízo.

Melhor não falar besteira, meu bem, mulher não entende de futebol, enquanto nós homens jogamos desde pequenos.Ele desvaloriza as suas opiniões, afirmando que, para seu próprio bem, você não deveria falar sobre um determinado assunto

Como saber se estou vivendo Gaslighting em uma relação abusiva?

Identificar se você está em uma relação abusiva pode ser difícil, especialmente porque abusos nem sempre envolvem violência física. Muitas vezes, eles surgem de forma sutil e podem afetar profundamente a autoestima e o bem-estar emocional. Alguns sinais de alerta incluem:

  1. Controle excessivo: seu parceiro tenta controlar suas roupas, amizades ou até mesmo suas opiniões? Tenta monitorar onde você está ou com quem fala? Esse tipo de controle é um sinal de alerta.

  2. Diminuição constante: uma pessoa abusiva costuma desvalorizar você, fazer críticas duras ou te culpar por tudo que dá errado. Esse comportamento pode minar sua confiança ao longo do tempo.

  3. Manipulação emocional: muitas vezes, quem está em uma relação abusiva se sente emocionalmente “preso”. A pessoa pode te fazer sentir que você precisa dela ou te culpa por problemas dela, usando a culpa para te controlar.

  4. Isolamento: se o parceiro tenta te afastar de amigos e familiares, pode ser uma tentativa de isolar você de sua rede de apoio, o que dificulta perceber a situação e buscar ajuda.

  5. Ameaças e intimidação: mesmo sem agressão física, ameaças ou intimidações podem gerar medo. Isso inclui ameaças de terminar, de machucar você ou a si mesmo, ou de expor algo pessoal para te manter na relação.

Se você percebe esses comportamentos, é importante lembrar que abuso não é algo que se “resolve sozinho”. Buscar apoio, conversar com pessoas de confiança e, se necessário, procurar ajuda profissional pode ser um passo essencial para recuperar sua autonomia e bem-estar. Lembre-se de que relações saudáveis são baseadas em respeito e apoio mútuo, e você merece estar em um relacionamento que promova o seu crescimento e felicidade.

Além dos sinais já mencionados, existem outros indícios que podem indicar que você está vivendo uma situação de abuso psicológico. Reconhecer essa situação é sempre doloroso. No entanto, se você chegou à essa conclusão, apesar de ser difícil, agora você sabe! Em primeiro lugar, busque sua rede de apoio. Procure orientação legal, se necessário. E, por fim, considere o apoio psicológico.

O Filme “Gaslighting”

Gregory desmonta a sanidade de Paula através de manipulações sutis e pequenas mudanças nos detalhes de suas conversas. Ele se porta sempre de maneira calma e razoável quando Paula fica chateada com as discrepâncias. Logo, ela assume que ele é o lúcido da relação e começa a duvidar de sua percepção da realidade e sua própria sanidade.

O ‘Gaslighting’ de Gregory sobre Paula é lento, constante e muito sutil. Ninguém de seu meio familiar suspeitaria que ele estivesse lentamente dirigindo sua mulher à loucura. Ninguém do âmbito social do casal jamais acusaria o sofisticado Gregory de ser um louco. Como ele conta histórias em público sobre a insana e frágil Paula (enquanto ele a mantém isolada em casa), seu círculo social o favorece.

Durante todo o filme, Gregory continuamente se apresenta como um marido amoroso, carinhoso, atraente e talentoso. Paula, por sua vez, começa o filme parecendo bonita, talentosa e sã. Mas, os jogos mentais de seu marido a desgastam e ela começa a surtar, mesmo em público.

Referência Bibliográfica:

  • DORPAT T.L. “Gaslighting, the Double Whammy, Interrogation, and Other Methods of Covert Control in Psychotherapy and Analysis”
  • TRACY N. “Gaslighting Definition, Techniques, and Being Gaslighted”
  • Assista ao filme aqui: energy-video type=”youtube” id=”SPcYkxmhGs0″
quem somos julia

Júlia Maria Alves

Psicóloga graduada pela UFMG (2009), com especialização em Clínica Psicanalítica na atualidade pela PUC-MG (2021) e em Gestão de Pessoas pela Fundação Dom Cabral (2012). Atua com atendimento clínico e orientação profissional e gestão de carreira.

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  1. Ana Paula Santos Fonseca 8 de maio de 2016 at 15:11 - Reply

    Eu perdi minha auto estima de tanto ouvi que sou louca que não aguenta mais

  2. Izabela Teles 8 de maio de 2016 at 03:43 - Reply

    Ana Rita Pessoa

  3. Eliene Pereira 5 de maio de 2016 at 16:21 - Reply

    Iramaia Almeida a pro Isaura, deu aula sobre isso, veja.

  4. Ceni Brito Dos Santos 4 de maio de 2016 at 12:19 - Reply

    Parece mentira, mas comigo acotece tdos os dias, ai gente Lebes que tá ficando, não sabe o que diz, as vezes duvido de mim mesma, estou ficando insegurara em tdo que faço, isso é um pecado que fazem com a gente.

    • Diálogo - Espaço de Psicologia 4 de maio de 2016 at 13:58

      Olá Ceni, sinto muito!! Sei que é difícil, mas é possível viver algo diferente e mudar a situação. O mais difícil é reconhecer, dói né? Recomendo procurar um profissional, buscar os recursos psicológicos necessários para reagir ao que te acontece. Não sei em qual cidade está, mas com certeza tem um psicólogo próximo e acessível. Não deixe de cuidar de você! ♡ Não se esqueça disso!

    • Carine Suder Fernandes 5 de maio de 2016 at 10:28

      E um dos primeiros passos é avaliar se esse relacionamento vale a pena.

    • Diálogo - Espaço de Psicologia 7 de maio de 2016 at 11:48

      Verdade Carine

    • Ceni Brito Dos Santos 7 de maio de 2016 at 12:17

      Diálogo – Espaço de Psicologia tem certas certs coisas q não dá pra falar no face, mas já fui no psicológo da minha cidade, êle pouco falou e me deu remédio e disse que eu era ums guerreiro o remédio me fez mal…obrigada de te preocupar comigo….bjusssd

    • Carine Suder Fernandes 7 de maio de 2016 at 13:27

      Oi, Ceni: Foi mesmo um psicólogo? Por que nós não prescrevemos medicação nem pra dor de cabeça…. Quando percebemos que a medicação pode ser uma via de ajuda, encaminhamos para médico/médica psiquiatra.

      E outra: chamar alguém de guerreiro/guerreira por suportar opressões e violência pode parecer elogio, mas não é mais do que a romantização da submissão. Ninguém é obrigada a nada. Se duvida do que digo, olhe na constituição.

      É muito injusto e cruel exigir que algumas pessoas sejam mais fortes do que o necessário por não terem alternativas.

    • Diálogo - Espaço de Psicologia 28 de maio de 2016 at 23:08

      Carine Suder Fernandes Ótima colocação! Obrigada por esclarecer, só vi agora!

    • Carine Suder Fernandes 29 de maio de 2016 at 00:32
    • Ceni Brito Dos Santos 29 de maio de 2016 at 11:11

      Carine Suder Fernandes foi Psiquiatra q fui e não psicólogo, desculpe minha colocação…bjusss

  5. Claudia Marcia Mendes 4 de maio de 2016 at 12:12 - Reply

    muitas vezes hoje não mais graças a Deus