O que podemos pensar sobre essa sequencia de desastres naturais (que não são tão naturais assim) que assolam Minas Gerais nos últimos anos?

“O projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
E um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um resto de mato, na luz da manhã
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração”

Assim cantou Tom Jobim há anos atrás e parece que foi uma narração do que estava por vir.  Basta trocarmos as ‘águas de março’ pelas ‘águas da barragem’ de Mariana em Minas Gerais ou pelas ‘águas das enchentes’ do Vale do Itajaí em Santa Catarina. Ou mais recentemente, as águas lamacentas em Brumadinho MG ou Nova Lima MG.

O que vivenciamos é uma sequência de “desastres naturais” que nos convocam a refletir sobre o estilo de vida que temos, até que ponto contribuímos ou criamos esses desastres e o que é possível fazer para mudar essa realidade? Ainda podemos nos questionar qual seria o nosso papel como seres humanos e profissionais (no nosso caso, Psicólogos) diante de tais realidades?

Convidamos a Raquel Ferreira Pacheco, psicóloga e integrante do “Grupo de Trabalho em Emergências e Desastres” do Conselho Regional de Psicologia de MG (CRP-MG), que escreveu uma pequena reflexão tentando responder a esses questionamentos.

Cedendo a Palavra!

Os desastres naturais, a sociedade e a Psicologia

Por Raquel Ferreira Pacheco

Nos últimos anos é possível notar um aumento considerável da ocorrência de emergências e desastres em nosso país. Desse modo, é preciso conhecer melhor esses fenômenos, como eles ocorrem, quais fatores os desencadeiam e, essencialmente, os fatores de risco e as vulnerabilidades de nossa sociedade.

Por mais que muito se fale em desenvolvimento sustentável desde o século XX, pouco se faz para que seja efetivamente realizado. Como aponta Heredia (2003, p. 113), segundo a ONU, na década de 90, “4.777 desastres naturais custaram mais de 880.000 vidas, afetando os lares, a saúde e o sustento de quase dois milhões de pessoas e causando cerca de US$ 685 bilhões em perdas econômicas no mundo inteiro” e esses números têm aumentado aceleradamente. As legislações em vigor e os projetos em votação, como o PL 2.946/15 corroboram com a ação desenfreada das mineradoras no estado de Minas Gerais e as fiscalizações não são suficientes.

Segundo reportagem publicada no jornal Estado de Minas, de 28 de setembro de 2013:

[…] o número de pessoas no Brasil em áreas de risco de inundações pode chegar a 42,5 milhões em 2030, 9,2 milhões a mais do que em 2010 (33,3 milhões), segundo estimativas da companhia de seguros Swiss-Re. A maior concentração deverá ser no Sudeste, com 17 milhões de pessoas em zonas com maior potencial de alagamento; 12,2 milhões no Nordeste; 6,9 milhões no Norte; 4,6 milhões no Sul e 1,8 milhão no Centro-Oeste. (CASTRO, 2013, p. 12)

Ocorrem os desastres “naturais”, como a mídia insiste em nomear, mas sabemos que, para que ocorram, precisam da incidência de uma série de fatores não naturais. A definição adotada a partir da 2ª Conferência Nacional de Proteção e Defesa Civil – CNPDC (2014) estabelece que um desastre é:

Resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem, sobre um ecossistema vulnerável, causan­do danos humanos, materiais e ambientais, com consequentes prejuízos econômicos e sociais.”

E, partindo-se dessa definição, precisamos entender o conceito de vulnerabilidade, que é um fator que aponta o risco de um desastre. Este fator vulnerabilidade é entendido pela Estratégia Internacional para a Redução de Desastres (UNISDR) como uma condição estabelecida por uma série de processos e fatores físicos, sociais, econômicos, ambientais e também culturais, os quais tornam a comunidade mais suscetível e exposta aos impactos das ameaças naturais, ou seja, existe atualmente em nosso país e em todo o mundo uma concepção social do desastre.

O rompimento das barragens das mineradoras nos distritos de Mariana, especialmente Bento Rodrigues, deve ser investigado e analisado sob uma ótica sistêmica, que pensa em todos os fatores que colaboraram para a ocorrência dessa tragédia.

E onde está a Psicologia?

O profissional da psicologia deve se apropriar de seu papel social e atuar junto aos profissionais das diversas áreas de conhecimento que trabalham em situações de emergências e desastres, como profissionais da saúde, da engenharia, da assistência social e outros.

Ademais, é necessário que se promova de fato políticas de prevenção aos desastres e mitigação dos seus efeitos danosos, bem como se trabalhe efetivamente para a construção de comunidades resilientes para que se evite as perdas humanas, ambientais, econômicas e sociais.

Referência

  • Fundação Oswaldo Cruz. Fiocruz. Ministério da Saúde. Brasil. Processo de luto no contexto da Covid-19. Brasília: Fiocruz, 2020. Disponível <aqui>

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Autor(a):

Raquel Ferreira Pacheco – Psicóloga (PUC-MG/2014) com experiência em Psicologia Clínica e Psicologia Hospitalar. Pós-graduada em Saúde Mental (IEC PUC-MG/2017). Residência Multiprofissional em Urgência e Emergência no Hospital João XXIII – FHEMIG. (2020). Graduada em Gestão Pública (UEMG/2011)., 

Psicóloga (PUC-MG/2014) com experiência em Psicologia Clínica e Psicologia Hospitalar. Pós-graduada em Saúde Mental (IEC PUC-MG/2017). Residência Multiprofissional em Urgência e Emergência no Hospital João XXIII - FHEMIG. (2020). Graduada em Gestão Pública (UEMG/2011).

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