Hoje, vamos explorar a fascinante história da expansão do movimento psicanalítico após Sigmund Freud. É essencial reconhecer que essa trajetória não foi linear, mas repleta de complexidades e marcada pela contribuição de diversos atores ao redor do mundo. Neste texto, investigaremos como a psicanálise se expandiu e influenciou diferentes contextos culturais e acadêmicos.
Primeiros atores na expansão da psicanálise
A psicanálise teve início com Sigmund Freud (1856–1939) em Viena, Áustria, por volta de 1900, com a publicação de A Interpretação dos Sonhos. Esse novo campo atraiu um pequeno grupo de interessados, levando Freud a criar as chamadas “Reuniões de Quarta-feira” em 1902. Este grupo se transformou em seguida na Sociedade Psicanalítica de Viena.
Em 1908, essa sociedade já contava com 14 membros regulares, incluindo figuras como Carl Gustav Jung (1875–1961), Karl Abraham (1877–1925) e Ernest Jones (1879–1958). Esses nomes desempenharam papéis fundamentais na criação da Associação Psicanalítica Internacional (IPA), fundada em 1910, expandindo significativamente o movimento psicanalítico.
Freud também manteve correspondência com diversos profissionais fora da Áustria. Por exemplo, Karl Abraham foi crucial para a expansão da psicanálise na Alemanha, com contribuições teóricas e a fundação da Policlínica de Berlim em 1920, a primeira escola de formação de analistas. Alunos notáveis como Klein, Horney, Deutsch, Strachey, Alexander, Balint, Fenichel e Loewenstein passaram por essa instituição.
Na Hungria, Sándor Ferenczi (1873–1933) se destacou com uma obra marcante. Na Suíça, Paul Eugen Bleuler (1857–1939) e Carl Jung contribuíram para a expansão da psicanálise, com Jung rompendo com Freud e desenvolvendo posteriormente sua própria abordagem, a Psicologia Analítica.
A emigração dos psicanalistas e o surgimento de novas escolas
Com a Segunda Guerra Mundial, a psicanálise enfrentou novos desafios. Freud, judeu, foi perseguido pelo nazismo, e muitos psicanalistas, como Bruno Bettelheim (1903–1990), foram enviados a campos de concentração. A violência e a perseguição levaram à emigração em massa de psicanalistas, contribuindo para a difusão do pensamento psicanalítico em países como Austrália, Argentina e Brasil.
Na Inglaterra, foi fundada a Escola Inglesa de Psicanálise, com nomes como Michael Balint (1896 – 1970), Wilfred Bion (1897 – 1979), Donald Winnicott (1896 – 1971) e James Strachey (1887–1967), este último o tradutor das obras de Freud para o inglês. Anna Freud (1885–1982) e Melanie Klein (1882–1960) também tiveram papel de destaque, embora divergissem em suas abordagens teóricas.
Anna Freud focava na integração entre pedagogia e psicanálise, além de desenvolver sua produção sobre os mecanismos de defesa. Por outro lado, Melanie Klein aprofundou o estudo das relações de objeto, influenciando gerações posteriores de psicanalistas.
Nos Estados Unidos, o trabalho de Anna Freud e outros psicanalistas ganhou uma nova forma e hoje é reconhecida através da Psicologia do Ego, com contribuições de Heinz Hartmann, Margaret Mahler e Otto Kernberg, entre outros. Essa abordagem destacava o papel do ego na dinâmica psíquica.
Lacan e o retorno à Freud
Mesmo após a morte de Freud em 1939, a psicanálise continuou a se expandir. Na França, a psicanálise foi impulsionada por Marie Bonaparte (1882–1962), analisanda e amiga de Freud, que ajudou a traduzir suas obras para o francês. Outra figura notável foi Françoise Dolto (1908–1988), conhecida por seu trabalho com crianças em situações de vulnerabilidade.
Jacques Lacan (1901–1981) emergiu como um dos principais nomes da Escola Francesa. Inicialmente ligado à Sociedade Francesa de Psicanálise, Lacan propôs uma reformulação da psicanálise, enfatizando um “retorno a Freud“. Fundou a Escola Freudiana de Paris, que se tornou uma referência mundial. No Brasil, a influência da escola francesa é notável, com diversas instituições seguindo as ideias de Lacan, além de outras alinhadas às tradições inglesa e americana.
No próximo texto continuaremos a falar mais sobre a história da expansão da Psicanálise e suas ramificações nos dias atuais. Até semana que vem. Aqui está o link para o próximo texto.
Referências bibliográficas
- DUNKER, C. I. L. – Aspectos Históricos da Psicanálise Pós-Freudiana In: História da Psicologia – Rumos e Percursos. Rio de Janeiro: Nau, 2006, v.1, p. 387-412. – Você pode achar o livro na Amazon.
- FREUD, S. (1996). Contribuição à história do movimento psicanalítico. In: Obras completas, vol11: Totem e tabu, Contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos (1912/1914) / Sigmund Freud; tradução Paulo César de Souza – 1ª Ed – São Paula: Companhia das letras, 2012.
- JONES, E. (1953-1957). A vida e obra de Sigmund Freud (3 vols.). tradução de Júlio Castafion Guimarães. – Rio de Janeiro: Imago Ed. – Você pode achar o livro na Amazon.
Júlia Maria Alves
Psicóloga graduada pela UFMG (2009), com especialização em Clínica Psicanalítica na atualidade pela PUC-MG (2021) e em Gestão de Pessoas pela Fundação Dom Cabral (2012). Atua com atendimento clínico e orientação profissional e gestão de carreira.